No acampamento

Artigos de Baden-Powell para a revista " The Scouter ", 1909 - 1941
traduzidos por: Capitão Anilto de Ribeirão Pires/SP. 


Tradução


No acampamento

Eu escrevi minhas notas este mês no acampamento. Eu espero que muitos Chefes Escoteiros tenham sido capazes de passar seus feriados deste ano em acampamentos, como eu. Se desfrutou disso tanto ou mais que eu, terá feito uma boa coisa.
Tenho certeza que uma semana ou duas de tal vida é o melhor descanso restaurador e o melhor tônico para o corpo e a mente que existem para uma pessoa, seja ele menino ou idoso. Por acampamento eu quero dizer um acampamento no bosque, não um acampamento militar para alojar um grande número de pessoas sob uma lona. Este não é mais parecido com o tipo de acampamento que eu defendo do que um gafanhoto é parecido com um ganso.
O acampamento Escoteiro deve ser do tipo acampamento de bosque, se quiser ser realmente bem educativo. Muitos acampamentos militares, não a maioria, são responsáveis por causar mais prejuízo do que bem aos jovens, exceto aqueles com boa administração e supervisão rígida. Considerando um acampamento mateiro, se corretamente desenvolvido dará desenvoltura individual e ocupação aos jovens todo o tempo.
Um grande acampamento tem necessidade de ser conduzido com uma quantidade considerável de rotinas disciplinares. Formaturas têm que ser asseguradas para dar ocupação e instrução aos jovens, reuniões fatigantes, inspeções de barracas, listas de chamadas, filas de banho, e assim por diante. Isto não serve para a revigorante vida ao ar livre, esse tipo de acampamento pode muito bem ser feito em barracas na cidade, não ensina aos jovens nada de individualidade, desenvoltura, responsabilidade, conhecimento da natureza, e muito menos (realmente pouquíssima) educação do caráter, para o qual o acampamento mateiro é o melhor, senão a única escola.
Mas um acampamento mateiro só pode ser realizado com um número pequeno de jovens, de trinta a quarenta, sendo este o máximo possível, e somente se o sistema de patrulhas for realmente e inteiramente colocado em uso.
Evidentemente é fácil alguém escrever a partir de um acampamento ideal deste tipo e pensar que todo mundo tem as mesmas possibilidades, mas eu não pretendo pensar dessa maneira. Eu sei as dificuldades daqueles que tem que argumentar com um Chefe Escoteiro na Inglaterra, mas quero colocar o ideal à frente desses que não tem refletido muito cuidadosamente sobre a questão, e são inclinados, por costume ou exemplo, a achar que a forma militar de acampamento é a habitual e correta para os jovens. O ideal deve ser seguido o mais fielmente possível que as circunstâncias locais permitam.
Aqui estou acampado perto de um rio que corre entre colinas revestidas de florestas. É perto de dez da manhã. Levantei-me as cinco, e estas cinco horas foram cheias de tarefas para mim, muito embora fossem não mais que pequenas tarefas de acampamento.

O fogão teve que ser reacendido, café e bolinhos foram feitos. Em seguida foram lavados e areados os utensílios de cozinha; coletada lenha para o dia (para queimar e formar brasa); uma nova barra e ganchos para panelas tiveram que ser cortados e aparados; uma tenaz para o fogo e uma vassoura de galhos para limpeza do chão do acampamento tiveram que ser cortados e feitos. A roupa de cama teve de ser arejada e guardada; as botinas foram engraxadas; o chão do acampamento foi varrido e o lixo queimado; a truta teve de ser destripada e lavada. Finalmente me barbeei e tomei um banho, e aqui estou pronto para as tarefas diárias que possam surgir. Mas levei cinco horas para tudo isso.

 

Eficiencia

Meu companheiro foi ontem para o vilarejo mais próximo e deverá voltar logo com nossas cartas e suprimentos. Ele me encontrará em algum lugar pescando ou desenhando, e juntando amoras para nossa “sobremesa” de compota de frutas ao jantar; mas encontrará o acampamento varrido e guarnecido, fogão pronto para ser aceso, panelas, copos e pratos todos limpos e prontos para uso, a comida à mão.
Nós podemos provavelmente “fazer as malas” e viajar em seguida, e ver um pouco mais das belezas da terra, como podemos “carregar nossas coisas” para o próximo local de acampamento com uma agradável paisagem. Então vem todo esse negócio de montar o acampamento, buscar água e lenha, fazer a comida, e buscar seu próprio conforto. Toda uma seqüência de pequenas tarefas cuja soma é importante. Todas elas dão prazer e satisfação ao homem mais velho, enquanto que aos mais jovens trazem prazer, experiência, desenvoltura, autoconfiança, pensamentos para os outros, e aquela excelente disciplina dos costumes campestres, sendo esperado que façam a coisa certa para eles.

Eles não têm nenhum tempo para inatividade, e não há espaço para o ocioso. Mas isto é uma coisa bastante diferente daquelas ruas de lona, onde os suprimentos são entregues por uma empresa, e cozidos e servidos por empregados contratados, com os jovens em rebanhos, fazendo somente o que os mandam fazer.

Setembro de 1911


Original


In Camp

I WRITE my notes this month from camp. I hope that many a Scoutmaster will have been able, like me, to take his holiday this year in camp. If he has enjoyed it half as much as I am enjoying mine, he will have done well.

I am certain that a week or two of such life is the best rest-cure and the best tonic for both mind and body that exists for a man, whether he be boy or old 'un. And for both it is a great educator. By camp I mean a woodland camp, not the military camp for barracking a large number at one time under canvas. That is no more like the kind of camp I advocate than a cockchafer is like a goose.

A Boy Scouts' camp should be the woodland kind of camp, if it is going to be any real good as an educator. Many, nay most, military camps are liable to do more harm than good to boys, unless exceptionally well-managed and closely supervised. Whereas a woodsman's camp, if properly carried out, gives the lads occupation and individual resourcefulness all the time.

A large camp has of necessity to be carried on with a considerable amount of routine discipline. Parades have to be held to give the boys instruction and occupation, fatigue parties, tent inspections, roll-calls, bathing parades, and so on. Were it not for the fresh, open-air life this kind of camp might almost as well be carried on in town barracks; it teaches the boys nothing of individuality, resourcefulness, responsibility, nature lore, and many little (though really great) bits of character education for which the woodsman's camp is the best, if not the only, school.

But such a camp can only be carried out with a small number of boys; from thirty to forty being the full number with which it is possible. And then only if the Patrol system is really and entirely made use of.

Of course, it is easy for one to write from an ideal camp of the kind and imagine that everybody has the same advantages, but I don't altogether mean to do that. I know the difficulties that one has to contend with as a Scoutmaster in England, but I want to put the ideal before those who have not perhaps thought out the question very carefully, and who, by custom or example, are inclined to take the military form of camp as being the usual and right one for boys. The ideal can then be followed as nearly as local circumstances will

allow.

Here I am camped by a rushing river between forest-clad hills. It is close on ten in the morning. I turned out at five, and yet those five hours have been full of work for me, albeit it was no more than little camp jobs.

The fire had to be lit, coffee and scones to be made. Then followed boiling and sand-scrubbing the cooking utensils; collecting of firewood for the day (both kindling and ember-forming wood); a new crossbar and pot-hooks had to be cut and trimmed; a pair of tongs for the fire, and a besom for cleaning the camp ground had to be cut and made. Bedding had to be aired and stowed; moccasins to be greased; the camp ground swept up and rubbish burned; the trout had to be gutted and washed. Finally, I had a shave and a bathe; and here I am ready for the day's work whatever it may be. But this took five hours to do.

My comrade went in yesterday to the nearest hamlet, and will be back to-day with our letters and supplies. He will find me away fishing or sketching, and gathering berries for our "sweet" of stewed fruit at dinner; but he will find the camp swept and garnished, fire laid ready to be lit, cooking pots, cups, and plates all ready and clean for his use, and food handy.

We may probably "up-stick" and travel on later in the day, and see some more of the beauties of the land, as we "hump our packs" to the next nice-looking site for camp. Then comes all the business of pitching camp, getting water and firewood, cooking food, and making oneself comfortable. All a succession of very little jobs, but which in their sum are important. They all give enjoyment and satisfaction to the older man, while to the boy they bring delight, experience, resourcefulness, self-reliance, thought for others, and that excellent discipline of camp-tradition and of being expected to do the right thing for himself.

They have no time for idleness, and give no room for a shirker. But that is a very different thing from the streets of canvas town where the supplies are sent in by a contractor and cooked and served by paid servants, the boys in a herd, merely doing what they are ordered to do.

September, 1911